Deixei dinheiro suficiente para pagar as bebidas em cima do balcão, e saí da lanchonete. Entrei no carro e dirigi por mais alguns quilômetros, até o apartamento 505. Eu sabia que ela estaria lá. Ela sempre estava lá.
Ela me recebeu com um sorriso triste, e eu sabia o que ele significava. Eu havia ficado algum tempo sem ir até lá, não sei se por pena dela ou por um simples teste egoísta; ver quanto tempo ela aguentava sem seguir em frente. Era como se eu estragasse a surpresa, tirando as mãos da frente dos olhos dela cedo demais.
Abracei-a com força, e ela, como sempre, caiu no choro. Por que eu continuava a fazer aquilo? Eu desmoronava quando ela chorava, e chorava com ela. Com seu “Olá!” que na verdade queria dizer “Eu sei que você está aqui agora, mas isso também quer dizer que você já está indo”.
- “Sweet eyes, I already miss you” – ela cantarolou, olhando nos meus olhos e passando os dedos levemente pela minha bochecha. Fechei os olhos e sorri, e logo que os abri, percebi que ela sorria também.
- Para. Espera um momento. Quando você olha assim pra mim, o que você espera?
- Seu sorriso.
- Por que você não vai embora, não me chuta, não me xinga, cada vez que eu reapareço aqui?
- Você sabe o porquê. – e pegou minha mão, me puxando pra dentro daquele apartamento que eu conhecia tão bem.
*
- Antes de vir pra cá, eu estava te imaginando exatamente assim: deitada no ‘seu’ lado da cama, com as mão por entre as pernas, e esse sorriso no rosto, me esperando.
Ela sorriu mais ainda, e virou-se pra mim na cama, me fitando por um momento com seus olhos verdes, e logo depois deitando a cabeça em meu peito. Eu sentia sua leve respiração, e quando ela pegou no sono novamente, me levantei. Vesti minhas roupas sem fazer barulho, e parti, como sempre.
Passando com o carro na frente de uma floricultura, comprei um buquê de orquídeas azuis.
“Desculpa partir assim, de novo, sem te dar adeus. Mas seu ‘olá’ já me dizia adeus, e não quis que você passasse por – mais um – adeus. Essas orquídeas são pra combinar com a cor da parede do seu quarto, que ‘acalma qualquer um’. Não vou mais voltar, dessa vez. Fui covarde por não te dizer isso pessoalmente, mas é verdade. Acho que já fui canalha demais com você, e não vou continuar com isso. Você se faz de forte, mas a cada vez que vou ai, vejo que você sofre. Essa brincadeira idiota já durou tempo demais.
Já estou escrevendo mais do que planejei. Pensei em apenas dizer ‘adeus’ e ‘nunca mais vou voltar’, mas isso é difícil. Por favor, não chore. Eu não mereço suas lágrimas mais uma vez. Siga em frente, de cabeça erguida, e ache alguém que te mereça, não um idiota qualquer que volta e te usa quando ele quer. Do seu covarde, o ultimo adeus.”
FIM
Baseado na música “505”, do Arctic Monkeys.
A música que a personagem cantarola é “I already miss you”, do The Kooks.
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Considerações finais:
Hey, então, consegui terminar, depois de um ano. Não que eu fiquei um ano sem escrever, mas eu tinha perdido essa 'história'. Não costumo fazer comentários dos meus textos e etc., mas esse é um que eu mais gostei de escrever, apesar do final não ter ficado lá essas coisas, mas ficou curto e... completo, como eu planejava. Eu sei que não é um super livro pra ter considerações finais, mas enfim. É isso. Eu realmente espero que tenham gostado, e desculpa o intrometimendo no final da leitura.