sábado, 24 de setembro de 2011

Sem olhar pra trás, parte 2/2

Deixei dinheiro suficiente para pagar as bebidas em cima do balcão, e saí da lanchonete. Entrei no carro e dirigi por mais alguns quilômetros, até o apartamento 505. Eu sabia que ela estaria lá. Ela sempre estava lá.
Ela me recebeu com um sorriso triste, e eu sabia o que ele significava. Eu havia ficado algum tempo sem ir até lá, não sei se por pena dela ou por um simples teste egoísta; ver quanto tempo ela aguentava sem seguir em frente. Era como se eu estragasse a surpresa, tirando as mãos da frente dos olhos dela cedo demais.
            Abracei-a com força, e ela, como sempre, caiu no choro. Por que eu continuava a fazer aquilo? Eu desmoronava quando ela chorava, e chorava com ela. Com seu “Olá!” que na verdade queria dizer “Eu sei que você está aqui agora, mas isso também quer dizer que você já está indo”.
            - “Sweet eyes, I already miss you” – ela cantarolou, olhando nos meus olhos e passando os dedos levemente pela minha bochecha. Fechei os olhos e sorri, e logo que os abri, percebi que ela sorria também.
            - Para. Espera um momento. Quando você olha assim pra mim, o que você espera?
            - Seu sorriso.
            - Por que você não vai embora, não me chuta, não me xinga, cada vez que eu reapareço aqui?
            - Você sabe o porquê. – e pegou minha mão, me puxando pra dentro daquele apartamento que eu conhecia tão bem.

*

            - Antes de vir pra cá, eu estava te imaginando exatamente assim: deitada no ‘seu’ lado da cama, com as mão por entre as pernas, e esse sorriso no rosto, me esperando.
            Ela sorriu mais ainda, e virou-se pra mim na cama, me fitando por um momento com seus olhos verdes, e logo depois deitando a cabeça em meu peito. Eu sentia sua leve respiração, e quando ela pegou no sono novamente, me levantei. Vesti minhas roupas sem fazer barulho, e parti, como sempre.
            Passando com o carro na frente de uma floricultura, comprei um buquê de orquídeas azuis.

“Desculpa partir assim, de novo, sem te dar adeus. Mas seu ‘olá’ já me dizia adeus, e não quis que você passasse por – mais um – adeus. Essas orquídeas são pra combinar com a cor da parede do seu quarto, que ‘acalma qualquer um’. Não vou mais voltar, dessa vez. Fui covarde por não te dizer isso pessoalmente, mas é verdade. Acho que já fui canalha demais com você, e não vou continuar com isso. Você se faz de forte, mas a cada vez que vou ai, vejo que você sofre. Essa brincadeira idiota já durou tempo demais.
Já estou escrevendo mais do que planejei. Pensei em apenas dizer ‘adeus’ e ‘nunca mais vou voltar’, mas isso é difícil. Por favor, não chore. Eu não mereço suas lágrimas mais uma vez. Siga em frente, de cabeça erguida, e ache alguém que te mereça, não um idiota qualquer que volta e te usa quando ele quer. Do seu covarde, o ultimo adeus.”

FIM

Baseado na música “505”, do Arctic Monkeys.
A música que a personagem cantarola é “I already miss you”, do The Kooks.


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Considerações finais:
Hey, então, consegui terminar, depois de um ano. Não que eu fiquei um ano sem escrever, mas eu tinha perdido essa 'história'. Não costumo fazer comentários dos meus textos e etc., mas esse é um que eu mais gostei de escrever, apesar do final não ter ficado lá essas coisas, mas ficou curto e... completo, como eu planejava. Eu sei que não é um super livro pra ter considerações finais, mas enfim. É isso. Eu realmente espero que tenham gostado, e desculpa o intrometimendo no final da leitura.

domingo, 18 de setembro de 2011

Sem olhar pra trás, parte 1/2

A garçonete, com um uniforme mínimo, como a de qualquer lanchonete de estrada, veio mais uma vez perguntar se eu queria comer alguma coisa, ou mais alguma bebida, já que meu copo de Martíni estava no final. Respondi que não, e ela voltou para a cozinha com uma cara desapontada, já que não dei a menor atenção aos seus peitos pulando para fora do decote. Comecei a passar o dedo indicador na beirada do copo em círculos.
Eu não tinha nada pra fazer, estava a meia hora em uma lanchonete qualquer que mal me lembro aonde fica, exatamente. Não é com isso que estou preocupado.
Me preocupo que, na verdade, eu tenho pra onde ir, tenho o que fazer. É só pegar o carro. É rápido. O problema são as consequências psicológicas que essa atitude pode trazer. Pegar o carro. Também não estou preocupado em sofrer um acidente. Ao contrário do que podem pensar, eu só bebi meia dose de Martíni, o que, com certeza, não é o suficiente para que eu perca o controle do volante, apesar da chuva fraca que continua caindo lá fora.
Eu podia simplesmente voltar, mesmo depois de um mês, uma semana, um ano. Sei que vou ser recebido de braços abertos, e sem perguntas do que andei fazendo esse tempo todo, enquanto estive fora sem dar notícias.
Mexi meus braços, ajeitando o casaco e olhando em volta, e vi a garçonete insistente cochichando para outra, e olhando indiscretamente na minha direção. Reparando nela, vi que é realmente bonita. Seu corpo, e seu rosto, também. Mas me vi procurando por características que conheço faz anos, e resolvi virar o rosto para o outro lado, fazendo uma careta. Pensar nela não me faz mal. O que me faz sentir mal é o meu egoísmo, que me faz ir lá sempre que me dá vontade, sempre que sinto falta disso. E, o pior de tudo, ir embora quando estou satisfeito, sem olhar pra trás. Na verdade, sem ter coragem de olhar pra trás, e vê-la chorando. Mais uma vez.
Eu sempre penso como é estranho o modo que, mesmo depois de ter chorado tantas e tantas vezes, mesmo sabendo que, uma hora ou outra, eu vou embora, ela sempre me recebe de braços abertos. Sempre. Sempre com o mesmo sorriso no rosto. Sempre. E eu sempre testando a sua capacidade de me perdoar, sempre indo lá, só por puro egoísmo e curiosidade, para ver se ela ainda vai me receber, se ainda me ama, como ela diz.
Puro egoísmo.
Pura curiosidade.
Pura maldade.
Levantando minha mão levemente, não demorou dois segundos para que a garçonete viesse até a minha mesa.
- Mais uma dose de Martíni, por favor.
- Só isso? - Ela me olhou com um sorriso de canto, nada discreta. Acenei com a cabeça, e a vi saindo mais uma vez desapontada com a minha falta de interesse.
A outra garçonete veio e trouxe minha dose, e também sorriu nada disfarçadamente, e reparei nos cabelos loiros delas, e seu rosto delicado, mas o que mais me chamou atenção foi aquele tom de verde dos seus olhos, que me deixou boquiaberto por alguns momentos, até que eu me recompusesse e sorrisse levemente, e fiquei olhando ela rebolar até que entrasse na porta da cozinha.
Agora a festa estava feita, ou a briga, a inveja por causa do meu deslize.
Sorrindo convencidamente, bebi um gole da minha bebida, imaginando as duas discutindo quem iria vir aqui se eu chamasse.
Por que minha mente sempre vagava para o mesmo lugar? Aquele apartamento que eu tanto conhecia. Aquela cozinha simples, com aquele balcão que me trazia lembranças que eu com certeza não me arrependia – até agora, pelo menos -; A sala, com um sofá bastante confortável (sorri bobamente ao lembrar isso); o quarto com uma pintura clara, que com a luz do sol trazia “paz de espírito até para o diabo”, como ela mesma disse uma vez. Eu provavelmente ainda adoro quando ela passa os braços em volta do meu pescoço. Ou pelo menos eu adorava a ultima vez que chequei. Era hora de checar novamente.

domingo, 11 de setembro de 2011

Our inability to think outside the box we know

Pular. Dançar. Braços dados. Braços separados. Um olhar dizendo "Aí está você!". Uma mordida, assim como da primeira vez. Pena que os sentimentos e a situação e tudo mais é muito parecido como daquela primeira vez.
Uma multidão, um andar distraido, um encontrão. Uma frase. Pergunta. Um balançar de cabeça como resposta. Um balançar de ombros como entendimento. Sair sem olhar pra trás. Um pensamento diferente, daqui pra frente. Não vale a pena. Nunca valeu, mas um balançar de cabeça serviu pra selar isso, não é?
Mas a inabilidade de pensar do lado de fora da caixa já conhecida fez com que isso fosse ignorado, descartado.
Parece que algumas coisas são diferentes daquela primeira vez, afinal de contas.